"Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma coisa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!
Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há-de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.
Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra que se não deixa salgar, que se lhe há-de fazer? Este ponto não resolveu Cristo, Senhor nosso, no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António, que hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou."
No Sermão de Santo Antônio aos Peixes, Vieira junta sua devoção ao santo à preocupação que o levaria, dias depois da pregação, a fugir secretamente para Portugal: a questão da escravidão e dos maus tratos contra os indígenas. A alegoria e a ironia são a chave de um discurso argumentativo que quer levar o ouvinte à reflexão. Ao mesmo tempo, a saudação inicial “Vós sois o sal da terra” é um chamamento à participação ativa na sociedade.
A discussão sobre as virtudes e os vícios humanos passa necessariamente por uma preocupação social. A ideia de que peixes maiores comem os peixes menores, ou seja, que a grandeza de cada um na sociedade tem valor relativo, surge espantosamente à frente do seu tempo. Em plena era mercantil, o texto de Vieira, por meio da alegoria, desvenda para os colonos do Maranhão a realidade da competição proto-capitalista: são peixes grandes na colônia, pois escravizam os nativos, que consideram inferiores, porém, uma vez na metrópole, serviriam de alimento para outros peixes maiores, contra os quais não teriam defesa.
Portanto, o texto de Vieira, datado do século XVII, traz para nós uma inquietante contemporaneidade, pois seus temas principais são a ganância humana e a corrupção da sociedade, assuntos mais do que presentes em nosso cotidiano. Por meio de sua linguagem finamente elaborada, Vieira nos faz refletir sobre os desafios da sociedade de seu tempo, nos ajudando também a pensar sobre a nossa realidade.
A discussão sobre as virtudes e os vícios humanos passa necessariamente por uma preocupação social. A ideia de que peixes maiores comem os peixes menores, ou seja, que a grandeza de cada um na sociedade tem valor relativo, surge espantosamente à frente do seu tempo. Em plena era mercantil, o texto de Vieira, por meio da alegoria, desvenda para os colonos do Maranhão a realidade da competição proto-capitalista: são peixes grandes na colônia, pois escravizam os nativos, que consideram inferiores, porém, uma vez na metrópole, serviriam de alimento para outros peixes maiores, contra os quais não teriam defesa.
Portanto, o texto de Vieira, datado do século XVII, traz para nós uma inquietante contemporaneidade, pois seus temas principais são a ganância humana e a corrupção da sociedade, assuntos mais do que presentes em nosso cotidiano. Por meio de sua linguagem finamente elaborada, Vieira nos faz refletir sobre os desafios da sociedade de seu tempo, nos ajudando também a pensar sobre a nossa realidade.
Referência:
http://sermoesdaveracidade.blogspot.com.br/2012/12/sermao-de-santo-antonio-aos-peixes.html
- Maria Fernanda
Na minha opinião, o Padre dedica esse sermão aos pecadores, aos falsos pregadores, que ao invés de buscar a santificação do mundo, fingem pregar a verdadeira palavra de Deus. Eu gostei muito da análise da Maria, e só queria destacar essa parte do que achei do texto, mas em si, Maria fez uma ótima análise, parabéns!!!
ResponderExcluirO Padre Antônio, falava aos peixes, mas pretendia criticar os homens, ou seja, é um sermão alegórico. Mas ele considera os peixes bons ouvintes, muito melhores que os ouvintes humanos. Uma vez que estes ouviam e calavam, enquanto as pessoas, mesmo antes de terminarem de ouvir, já estão a criticar, a dizer suas opiniões. Não dando oportunidade ao Pregador de acabar a sua tese, de usar os argumentos adequados à situação, não deixando exemplificar com situações concretas para ser de mais fácil compreensão. A mensagem veiculada por este sermão é absolutamente atual, pois a nossa sociedade continua materialista, interesseira e ambiciosa, é constituída por poderosos que humilham, desprezam e oprimem os mais fracos, explorando-os e subjugando-os. Assim, o sermão critica e denuncia comportamentos que o homem deve afastar de si para seguir outro rumo e colocar em prática os valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade.
ResponderExcluirNa minha opinião, Padre quis dizer que nós somos o sal da terra, mas às vezes não salgamos a terra. Nós estamos tão preocupados com nós mesmo, que esquecemos de ajudar o outro que está em nosso redor e quando tentamos ajudar as próprias pessoas não permitem que isso aconteça.
ResponderExcluirEstamos vivendo em um mundo onde existe muitas pessoas que se fazem de "sal da terra" só para se aproveitar daqueles que estão vulneráveis a cair e precisam de ajuda, e também de pessoas que não querem ser ajudadas.
Maria está de parabéns pela sua análise!
Gostei muito do ponto de vista que ela destacou.
De acordo com o que eu pude ler desse trecho do sermão e da análise elaborada por Maria, pude concluir que Padre Antônio Vieira busca fazer uma crítica a humanidade e também as ambições que nós humanos temos. Mesmo sendo escrito no século XVII, esse sermão serve como exemplo de críticas e reflexões para os dias atuais. E nele podemos encontrar muitas dúvidas sobre a nossa sociedade atual. Como por exemplo: Quem será que é o sal e quem será que é o pregador? Será que estamos agindo conforme nossa razão ou conforme com o que aprendemos? Será que estamos vivendo de acordo com nossas ambições sem ligar para as outras pessoas? Nossa! Quantas perguntas esse sermão nos propõe ter, não é mesmo? Vejo que precisamos esquecer um pouco de nós mesmos, do nosso ego, para ajudarmos as pessoas que estão ao nosso redor e procurarmos alguma solução para os desafios que rodeiam a nossa sociedade.
ResponderExcluirO meu entendimento foi que Padre faz uma crítica a nós humanos, que ao contrário de purificarmos a terra, ou seja viver uma vida não corrompida e seguir o que Deus quer de nós, acabamos sucumbindo aos nossos desejos assim ocorrendo que o que deveria purificar acaba sendo corrompido. Isso ficou explícito na explicação de Maria, excelente.
ResponderExcluirEle usa e abusa do cultismo. Da para ver uso de linguagem rebuscada, culta, extravagante, repleta de jogos de palavras. Um exemplo no texto disso é "O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção?". O cultismo é uma característica do barroco e é uma honra ter uma autor desse na nossa literatura brasileira.
ResponderExcluirGostei muito do que li aqui. Parabéns, pessoal! Porém, gostaria de ver alguém explicando sobre o conceptismo na obra de Vieira. Até agora vocês nem sequer mencionaram essa característica.
ResponderExcluirO conceptismo, que ocorre principalmente na prosa, é marcado pelo jogo de ideias, de conceitos, seguindo um raciocínio lógico, nacionalista, que utiliza uma retórica aprimorada. A organização da frase obedece a uma ordem rigorosa, com o intuito de convencer e ensinar. Um exemplo de prosa conceptista:
Excluir"Para um homem se ver a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelhos e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos." (Pe. Antônio Vieira)
O conceptismo, que ocorre principalmente na prosa, é marcado pelo jogo de ideias, de conceitos, seguindo um raciocínio lógico, nacionalista, que utiliza uma retórica aprimorada. A organização da frase obedece a uma ordem rigorosa, com o intuito de convencer e ensinar. Um exemplo de prosa conceptista:
Excluir"Para um homem se ver a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelhos e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos." (Pe. Antônio Vieira)
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirJSTOR, Malta - Casino - JT Hub
ResponderExcluirJSTOR 상주 출장안마 casino offers games from top providers and a great 창원 출장마사지 selection of games. Join now to claim 수원 출장마사지 great bonuses & 수원 출장마사지 start 보령 출장마사지 playing!